Esteróides anabolizantes...quebrando o tabu

Drogas em medicina referem-se a qualquer substância com o potencial de prevenir, curar doenças ou aumentar o bem-estar físico ou mental. Em farmacologia referem-se a qualquer agente químico que altera os processos bioquímicos e fisiológicos de tecidos ou organismos.
Tratando-se de drogas ou medicamentos, o seu uso trará benefícios mas inevitavelmente efeitos prejudiciais para o nosso organismo. Através do uso ‘’consciente/moderado’’ podemos reduzir o prejuízo ao máximo e tentar maximizar os seus benefícios:
  • Da mesma maneira que um Ben-u-ron (Paracetamol) bem utilizado pode ajudar a reduzir a dor, dois comprimidos poderão fazer um melhor trabalho mas a um custo mais elevado, 
  • A partir do terceiro comprimido os benefícios serão menores e os prejuízos maiores, sendo isto mais evidente à medida que se aumenta a quantidade ingerida.
Chama-se a isto a lei da utilidade marginal.
Esta lei é decrescente, pois à medida que aumentamos o consumo de algo, o seu benefício reduz por unidade aumentada, até atingir a nulidade, neste caso com prejuízos para a nossa saúde.
Mas afinal o que são os esteróides?
Para compreendermos isto temos primeiro de definir o que é a testosterona, a hormona primária do sexo masculino que é produzida nos testículos. Esta tem propriedades ditas andrógenicas (masculinizantes) muito percetíveis na puberdade, das quais se ressaltam os seguintes efeitos:
  • Agravamento da voz, 
  • Crescimento dos pêlos faciais e corporais,  
  • Aumento da produção de óleo das glândulas sebáceas,  
  • Desenvolvimento dos órgãos sexuais,  
  • Maturação do esperma,  
  • Aumento da libido. 
Além das suas propriedades androgénicas, a testosterona também possui propriedades anabólicas tais como:
  • Promoção do crescimento (muscular e não só), 
  • Aumento do rácio de síntese proteica (levando à acumulação muscular),
O corpo masculino produz de 2,5 a 11mg de testosterona por dia, enquanto que o feminino produz 0,4mg diárias (isto ajuda a explicar a diferença de massa muscular e força que se observa entre o homem e a mulher). 
Dado as suas propriedades um enorme interesse se reuniu à volta desta hormona. Quando a sua estrutura química foi finalmente sintetizada, por volta dos anos 30, muitos consideraram-na como um elixir da juventude. 
Do esforço de criar um derivado sintético da testosterona que contivesse apenas os efeitos desejáveis e eliminasse os seus efeitos negativos, nasceram os esteróides anabolizantes. Basicamente tentou-se criar um esteróide perfeito, com propriedades anabólicas e sem as propriedades androgénicas. 
Devido à falta de entendimento de como funcionava a assimilação destas hormonas os cientistas na altura não perceberam que tal não era possível e embora se tenham criado milhares de derivados da molécula de testosterona, nenhum deles tem propriedades exclusivamente anabólicas.
No entanto, diferentes esteróides têm diferentes propriedades, uns mais anabólicos que outros, outros mais androgénicos, outros mais suaves nos efeitos secundários, mas também mais suaves nos efeitos desejáveis.
Aplicações clínicas dos esteróides anabolizantes:
  • Hipogonadismo - defeito no sistema reprodutor que resulta na diminuição da função das gónadas (ovários ou testículos), 
  • Angioedema hereditário - doença rara do sistema imunitário,  
  • Anemia - síndrome na qual a capacidade do sangue de transportar oxigénio para os tecidos está reduzida,  
  • Cancro da mama - Quando as células mamárias não morrem ao envelhecerem ou danificam-se e produzem novas células (que não são necessárias) de forma descontrolada, resultando na formação de um cancro,  
  • Diminuição da atividade fibrinolítica – diminuição do processo através do qual um coágulo de fibrina (produto da coagulação do sangue) é destruído,  
  • Infertilidade masculina - é o resultado de uma falência orgânica devido à disfunção dos órgãos reprodutores, dos gâmetas ou do concepto,  
  • Baixa libido feminina – baixo interesse sexual ou falta do mesmo,  
  • Osteoporose - é uma doença óssea sistémica caracterizada por uma densidade mineral óssea diminuída e alterações da microarquitectura e da resistência ósseas que causam aumento da fragilidade óssea e, consequentemente, aumento do risco de fracturas,  
  • Perda de peso ou massa muscular severa, como no caso de doentes com SIDA, entre outros...
Como podemos observar a testoesterona é uma hormona essencial no desenvolver do nosso organismo, estando intrinsecamente ligada a várias áreas do nosso bem estar. Ter uma produção normal e saudável destas hormonas é indespensável para se ambicionar qualidade de vida e a sua toma exógena (através de medicamentos) é indicada no tratamento de algumas doenças ou no caso do nosso corpo estar em déficit na produção das mesmas.
Tudo isto seria perfeito se não houvesse contra indicações mas a verdade é que ao tomar estes medicamentos sem sofrer das patologias acima descritas, iremos desregular o nosso organismo e possivelmente sofrer consequências nocivas.
Efeitos nocivos do uso de esteróides anabolizantes
No sistema cardiovascular através:
  • Da alteração dos valores do colesterol, diminuição dos calores do HDL e aumento dos valores LDL, 
  • Hipertrofia cardíaca, aumento da espessura ventricular sem o aumento do interior da cavidade que pode levar a taquicardias, arritmias, entre outras patologias,  
  • Danos na parte muscular do coração através de um possível efeito tóxico que pode causar fibroses, inflamação ou necrose miocardial (entre outros),  
  • Aumento da pressão arterial,  
  • Alterações hematológicas que podem reduzir a capacidade de coagulação,  
  • Alteração dos níveis de homocisteína aumentando o risco de doenças cardiovasculares, 
No sistema imunitário através da sua supressão reduzindo a resistência a certos tipos de infecções.
No sistema renal e hepático (rins e fígado) devido a toxicidade e ao stress que causam na sua assimilação.
A nível físico:
  • Acne, excesso de estimulação das glândulas sebáceas pode levar ao seu aumento e a uma hiperactividade levando ao seu entupimento e consequente acne, 
  • Perda de cabelo, o efeito androgénico dos esteróides anabolizantes enfraquece os folículos capilares levando à perda de cabelo,  
  • Interrupção do crescimento, quando tomados antes de se atingir a maturidade física, podem prematuramente encerrar o crescimento ósseo, levando a interrupção do crescimento (altura),  
  • Retenção de água e sal, alguns esteróides têm este efeito secundário que leva ao aumento da pressão arterial e stress do sistema cardiovascular e renal,  
  • Engrossamento da voz, mais notado nas mulheres, um dos seus efeitos androgénicos,
  • Ginecomastia (homens), a aromatização (conversão de testosterona em estrogénio feita pela enzima aromatase) pode originar o desenvolvimento de peitos femininos no corpo masculino,  
  • Clitoromegalia (mulheres), aumento anormal do clitóris que uma vez instalado não reverte com a descontinuação do uso,  
  • Irregularidades menstruais (mulheres), alteração dos ciclos menstruais e interrupção da fertilidade,  
  • Diminuição do tamanho do peito (mulheres), inibição do crescimento e efeito de suporte do estrogénio nos tecidos mamários, o que pode causar uma redução visível no tamanho do peito. 
A nível psicológico:
  • Agressividade, níveis elevados de androgénicos podem levar a um aumento da irritabilidade, temperamento explosivo e agressividade, fator também individual e variável de pessoa para pessoa, mas de certa forma generalizado, 
  • Depressão/ dependência psicológica, após a descontinuação de um ciclo muitos dos ganhos musculares (lenta ou rapidamente) acabam eventualmente por desaparecer, levando a problemas psicológicos no lidar com esta perda e a desenvolver vontade de retomar a administração dos mesmos esteróides em quantidade igual ou superior. O rompimento do ciclo sem a administração de uma terapia pós-ciclo deixa o corpo desequilibrado hormonalmente, fator decisivo também nesta desmotivação, descontentamento ou depressão,  
  • Insónia, condição que parece estar relacionada com o desequilibrio hormonal, mais propriamente com baixos níveis androgénicos característicos do pós ciclo.
A nível reprodutivo:
  • Infertilidade, o uso de esteróides anabolizantes envia a mensagem ao eixo hipotálamo/pituitário/testicular (responsável pela produção de testosterona e dos espermatozóides) de que um excesso de hormonas sexuais existe no corpo, levando à cessação da produção dos mesmos. As concentrações e qualidade do esperma são reduzidos podendo originar infertilidade momentânea que pode ser agravada se o uso for muito prolongado, 
  • Disfunção sexual/perda da libido, os esteróides podem alterar o funcionamento e o desejo sexual, consoante as dosagens e o tipo de esteróide aplicado. É comum haver um aumento da libido durante o ciclo, seguido de uma queda após do mesmo. Alguns esteróides não têm este efeito estimulatório, nomeadamente aqueles com menor atividade androgénica, resultando em baixa libido durante o próprio ciclo,  
  • Hipertrofia e cancro da próstata, os androgénios são essenciais no desenvolvimento da próstata nos primeiros anos e na sua funcionalidade através da vida adulta. O aumento do nível androgénico pode causar um aumento do tamanho desta glândula. A hipertrofia da próstata (condição comum na terceira idade) pode originar dificuldades e desconforto a urinar, no fluir diminuído da urina e mudanças na própria frequência com que se urina. O cancro da próstata tem correlação com o nível androgénico, mas não de uma forma direta. Estudos não explicam esta relação, mas um elevado nível destas hormonas pode aumentar o risco de cancro nesta glândula,  
  • Atrofia testicular, o uso de esteróides anabolizantes envia a mensagem ao eixo hipotálamo/pituitário/testicular (responsável pela produção de testoesterona e dos espermatozóides) de que um excesso de hormonas sexuais existe no corpo, levando à cessação da produção dos mesmos. Esta falta de estimulação causa uma atrofia dos testículos que diminuem em volume e forma. Este efeito é temporário e reversível,  
  • Entre outros...
Muitos destes efeitos não estão estudados mas apenas documentados e muitos deles resultam do abuso destas mesmas substâncias (uso de doses supra terapêuticas). Alguns efeitos são revertíveis ou podem mesmo não existir dependendo da substância a ser utilizada, enquanto que outros são diminuídos ou anulados com a aplicação de outros medicamentos (caso do acne, perda da libido, ginecomastia, entre outros).
Portanto muito depende do tipo de uso, dosagens e duração que se dá aos ciclos de esteróides anabolizantes, tanto podem ser medicamentos extremamente nocivos para a saúde, como podem ser perfeitamente recomendáveis do ponto de vista clínico.
Então que razões podem haver para recorrer a medicamentos potencialmente perigosos? 
  • Eu compreendo que no desporto de alta competição, onde um segundo pode fazer a diferença entre um novo recorde mundial ou uma medalha de ouro, qualquer avanço ou vantagem seja tomada em conta, 
  • Da mesma forma que no cinema, na moda, ou em profissões que envolvem o uso da imagem e do corpo, a procura destas substâncias (com efeitos secundários nocivos para a nossa saúde) seja também opção, trata-se de trazer dinheiro para casa no final do mês,  
  • Profissões que envolvem o desempenho físico como na área da segurança pública ou privada também podem envolver esta escolha.
Temos de colocar numa balança os prós e os contras.
A verdade é que os efeitos secundários de doses supra terapêuticas não foram alvo de atenção médica e o uso de quantidades não abusivas (que incluam uma terapia de recuperação da produção hormonal no pós ciclo) pode resultar em efeitos negativos pouco pronunciados.
Como escrito anteriormente, este blog destina-se a desmistificar conceitos e opiniões aceites na generalidade como verdades inquestionáveis e os esteróides não fogem à regra. Para tomar decisões é preciso termos informação e conhecimento, mas nesta temática estes estão poucos disponíveis e são de fontes pouco confiáveis.
O livro em que me baseei, maioritariamente, para escrever este artigo foi o Anabolics 10th Edition E-Book, escrito por William Llewellyn. Para quem estiver interessado em saber mais acerca destas substâncias fica a recomendação, é um livro bastante técnico mas com aplicação prática.
Sou a favor da saúde em todas as suas componentes, mas também sou a favor de aproveitar as oportunidades que a ciência nos proporciona, não fosse este assunto tão contraditório, não seria objecto de tabu.
É preciso fazer mais com menos, tomar o mínimo necessário e saber aproveitar ao máximo os benefícios destes medicamentos, de forma a ter o mínimo dos efeitos nocivos. Aqui reside a importância do conhecimento e informação, pois esteróides anabolizantes pouco fazem a quem não sabe comer, treinar e descansar.
Quem não tiver disciplina mental não vai tirar proveito destes fármacos.
Conhecimento é poder