Quantos abdominais devo fazer para perder barriga?

A resposta certa a esta pergunta é nenhuns!
Mito bem enraizado no nosso subconsciente colectivo, ainda acreditamos que exercitar uma parte específica do corpo irá trazer beleza (massa magra, tonificada, torneada e retirar gordura) a esse mesmo local, como se funcionasse de forma separada e isolada do resto do corpo.
Mas antes de mergulharmos mais profundamente nos mecanismos da perda de peso vamos responder à pergunta...
O que entendemos por ''perder'' barriga?
  • É perder gordura? 
  • É ganhar tonificação ou definição muscular?  
  • São as duas anteriores ao mesmo tempo?  
  • É perder volume? Na fita métrica/roupa ou no olho/espelho/foto?
Há várias maneiras de encarar esta questão, precisamos de ser objetivos se queremos entender porque o exercício físico localizado não nos faz ''perder'' barriga.
De facto, o exercício físico, quando feito de forma equilibrada e não excessiva (overtraining/under resting) fortalece e tonifica a nossa massa muscular e isto pode levar a um crescimento muscular, que por sua vez pode levar a um aumento do volume, aumento este percepcionado como ''ganho'' de barriga.
Se tivermos gordura na zona da cintura e fizermos abdominais sem alterar o nosso plano de alimentação corremos o risco de parecermos mais gordos.
Se exagerarmos no ''esquema'' de abdominais e não dermos o descanso suficiente a esse músculo, arriscamo-nos a perder tonificação e embora visualmente as coisas não mudem muito (para quem tem gordura nesta zona), ao toque estaremos mais ''flácidos''.
Por mais voltas que dermos existe uma verdade quase universal que nem as supra potências da indústria farmacêutica e dos suplementos conseguem mudar, nem mesmo com os seus milhões gastos em marketing:

  • A gordura perde-se no corpo inteiro de forma geral e não local, enquanto que a massa muscular pode ganhar-se de forma isolada e localizada.
Portanto fazer (apenas) exercícios que estimulem a massa muscular de determinada zona nunca irão diminuir o seu volume.
As regras que regem a tonificação e o aumento da massa muscular bem como da perda de gordura são complexas e existe todo um processo fisiológico e metabólico por detrás que tem de ser compreendido. Vamos analisar como este processo se desenrola.
De uma forma geral temos 3 componentes que influenciam o crescimento muscular e a perda de gordura, a saber:

  • Alimentação/nutrição, 
  • Actividade física,  
  • Descanso.
Estes precisam de estar coordenados para que se atinja um fim proposto.
Consoante a nossa finalidade, varia também o tipo de exercício físico ou a alimentação que devemos seguir. Vamos analisar um a um e perceber a sua influência no nosso corpo de forma isolada (ceteris paribus).
Alimentação/nutrição
Se eu quiser perder gordura tenho de fazer uma alimentação diferente da que faria se quisesse ganhar massa muscular.
Para ganhar massa muscular precisamos de ingerir mais nutrientes para crescer, ou seja, comer em qualidade (para não ganhar muita gordura além da massa muscular) e em quantidade (superavit calórico), o que implica ganhar alguma massa gorda também.
No entanto existem exceções, pessoas que neste departamento levam a vantagem de não acumularem massa gorda, mesmo que comam demais ou em pior qualidade.
As razões para isto não estão bem elucidadas mas prendem-se com o nosso biotipo que podem investigar melhor nos seguintes Posts:

Para perder gordura precisamos de ingerir alimentos de boa qualidade e em quantidade apenas o suficiente (e não em demasia) para assegurar que a perda de peso é quase que exclusivamente de gordura e não de massa muscular.
Muitas pessoas querem perder peso (quilogramas na balança) e muita da atenção da indústria da cosmética, farmacêutica e da suplementação vai neste sentido, gastam-se rios de dinheiro em publicidade e marketing que tornam a balança no nosso carrasco e elemento punitivo, mas a verdade é que não adianta termos o ''peso certo'' se não gostamos do que vemos ao espelho.
No fundo o que importa é perder gordura e alterar as nossas formas ao invés de perder quilos, coisa que pode estar correlacionada ou não, pois não existe ''peso certo''. A massa muscular pesa mais que a gordura e cada pessoa tem a sua estrutura óssea que lhe pode conferir mais ou menos peso, para a mesma altura e medidas.
Portanto vamos focar-nos na perda de gordura e tonificação muscular, bem como nas formas do nosso corpo (proporções) e abandonar a balança e o peso.
Para um aprofundamento destas ideias podem ler os Posts:

Na prática, uma alimentação que estimulará a perda de gordura e que manterá a massa muscular que temos tem de ser baseada em carboidratos de baixa carga glicémica (que não estimulem a libertação de insulina), em gorduras saudáveis que sirvam de fonte de energia (eat fat to burn fat) e proteína que mantenha a massa muscular em tempos de restrição calórica como será o caso.
Resumidamente comer menos açúcares (carboidratos) de má qualidade e de alta carga glicémica (cereais e farinhas brancas/refinadas) e comer mais proteína, lípidos e carboidratos de baixa carga glicémica (vegetais).
Em relação a isto podem ler os Posts:

Considerava que na questão da perda de gordura a variável alimentação/nutrição corresponde a mais de 80% do resultado final, mas hoje vejo que se não tivermos um descanso adequado (sono de qualidade/quantidade) o nosso corpo esterá hormonalmente desequilibrado e conseguirá fazer o seu trabalho de forma eficiente.
Como vamos ver, perder barriga não é só perder gordura...posso perder gordura através de um bom regime alimentar mas ganhar massa muscular na zona da cintura com exercício específico para essa zona, o que se pode traduzir num aumento real do volume dessa zona, ou uma perceção de aumento da cintura (perda de proporções/silhueta).
Exercício físico
O exercício físico pode ser feito de forma moderada (em termos de quantidade/volume e respeitando os necessários tempos de descanso entre sessões de treino), promovendo o reforço da massa muscular e a sua tonificação.
A tonificação define-se como a acção de adquirir vigor e força física.
Ou seja, de ganhar aquele aspeto ''rijo'' e saudável que um músculo ou corpo bem exercitado têm, coisa que não implica necessariamente um aumento de volume da massa muscular.
Podemos treinar para manter a massa muscular sem aumento do seu volume, apenas o seu condicionamento e tonificação.
No entanto, se tivermos um grande índice de massa gorda a ''cobrir-nos'' os músculos, mesmo que estes estejam exercitados, dificilmente se verá a sua tonificação.
Entra aqui o conceito de definição muscular, que é a nitidez com que se vê a olho nu as formas de um músculo bem como, num nível mais acima, se diferencia as próprias fibras musculares dentro desse mesmo músculo.
Várias coisas contribuem para a percepção de definição, desde o desenvolvimento desse músculo (volume), a luminosidade e tom de pele e, claro está, a ausência de tecido adiposo a cobri-lo (gordura).

  • Se o exercício for feito de uma forma intensa com o objetivo de hipertrofia (crescimento da massa muscular), a tonificação e o reforço são acompanhadas de um aumento do volume, coisa que não é indicada para quem quer ''perder barriga''. 
  • Se o exercício for feito de forma excessiva (muito volume de treino e/ou pouco tempo de descanso entre sessões de treino) o músculo pode perder tonificação e ficar flácido, o que não irá interferir com a perceção do seu volume (a barriga não fica pequena nem maior), apenas com a sua qualidade.
Pessoas com muita gordura à volta da barriga não notarão perda de tonificação, este efeito só será visível em pessoas que não têm gordura e que portanto não precisam de ''perder'' barriga.
A massa muscular, ao contrário da gordura pode-se ganhar de forma geral ou localizada, dependendo do tipo de exercícios, método de treino e genética de cada pessoa:

  • Exercícios compostos como agachamentos e peso-morto irão solicitar uma grande diversidade de grupos musculares e estimular um crescimento mais geral do que exercício isolados como Curl de Biceps ou Leg Extension, 
  • Quanto pior executado for um exercício (do ponto de vista técnico) ou maior a carga, mais dificuldade teremos em isolar o músculo e da mesma forma, maior número de grupos musculares solicitaremos para completar o mesmo,  
  • O método de treino também influencia este processo geral ou isolado, pois quanto mais privilegiar o aumento de força ou explosão, maior estímulo para o aumento da produção de hormonas como a testosterona, hormona de crescimento e IGF-1, que contribuirão para o aumento de massa muscular de uma forma não isolada,  
Terá o exercício físico algo de benéfico a acrescentar a quem quer ''perder'' barriga?
Com um plano de alimentação e o descanso adequado o exercício físico pode estimular indiretamente a perda de gordura bem como tonificar diretamente a zona pretendida.

  • Nós perdemos/queimamos gordura a toda a hora, a andar, a falar, a arrumar a casa, etc,
  • Esforços diferentes exigem gastos energéticos diferentes e quanto mais intensos maior a queima de energia. Após certo nível de intensidade deixamos de preferir a queima de gordura em detrimento de glicogénio (açúcares) e aminoácidos (proteína), mais fáceis de ''queimar'' para esta obtençã,
  • Treinos intensos causam rompimentos mais severos nas fibras musculares que irão exigir reparações mais intensivas nos períodos de descanso (o chamado EPOC), reparações essas que irão utilizar energia mobilizada dos depósitos adiposos (queima-se gordura), 
  • Treinos ligeiros reforçam e tonificam a massa muscular, não contribuem para um grande consumo energético no período de descanso (as fibras musculares não sofreram rompimentos tão severos) mas acabam por queimar alguma gordura (pouca) no seu decorrer, através de um maior uso do sistema oxidativo de energia, assim como uma vida mais activa seja a ''apanhar as escadas'' em vez do elevador, a caminhar mais e a andar menos de carro, etc...  
  • Podem ler o Post ''Plano de Alimentação (parte 1)'' para aprofundarem melhor esta matéria.
Resumidamente, o exercício físico pode contribuir indiretamente para ''perdermos'' barriga, mas o segredo parece recair mais sobre não ganhar gordura do que queimar gordura, algo que ocorre naturalmente e frequentemente.
Descanso
O descanso tem importância no sentido em que é neste período que uma grande quantidade de hormonas é produzida, hormonas essas que vão contribuir para o equilíbrio do nosso metabolismo, bem estar físico bem como psicológico.
É também neste período que o corpo mais queima gordura, derivado do esforço despendido nos treinos...parece estranho não é?
A verdade é que ''queimamos'' mais gordura no período de descanso do que no período em que treinamos vigorosamente e essa razão prende-se com o uso de diferentes sistemas de energia consoante a intensidade do esforço que estamos a desenvolver, ou seja, a dormir a intensidade é mínima, logo maior disponibilidade metabólica existe para ir buscar ácidos gordos à camada adiposa e perder tempo na sua decomposição e posterior transformação em energia.
Mais pormenores podem ser lidos nos Post ''Treinos de Endurance VS Treinos de Força (Sistemas de Energia e Limiar Anaeróbico)''. 

Resumidamente, se eu não dormirmos o suficiente o corpo começa a acumular gordura e a desfazer-se da sua massa muscular que considere que tenha a mais. Dá-se todo um desiquilibrio químico e hormonal que origina esta consequência.
Pensem nisto desta forma:

  • O corpo encara a gordura como reservas de energia fáceis de manter por se encontrarem bem empacotadas (cada grama de gordura fornece 9kcal ao invés das 4kcal da proteína ou carboidrato), enquanto que a massa muscular exige alta manutenção, mais energia para as alimentar e nutrir, 
  • Lembrem-se que nós estamos sempre em funcionamento, mesmo parados temos sangue a correr, coração a trabalhar, pulmões a dilatar e a contrair, cérebro em funcionamento, todos estes processos requerem uma gestão e distribuição de energia (gastos energéticos) seja para construir novos tecidos ou manter os já existentes,  
  • Se estamos a dormir mal, seja em quantidade insuficiente ou em má qualidade, as condições para esta logística não estão reunidas e a predisposição natural do corpo será ''livrar-se'' do que está em ''excesso'' ou é dispensável, e manter as suas reservas de energia. Desta forma, se se mantiver a presente situação (de pouco descanso) o corpo garante um futuro com menor exigência energética, uma espécie de prevenção.
Assim se dá o catabolismo, destruição de tecido muscular (neste caso) para construir novos tecidos ou usá-lo para criar energia. Se dormirmos mal, o corpo vai agarrar-se a todas as gorduras e estas serão sempre as últimas a serem queimadas.
Para ficarem mais por dentro podem ler o Post ''A importância de um sono/descanso adequado''.
Conclusão
Têm gordura acumulada na zona da cintura de que se querem livrar?

  • Mudem a alimentação, sem comidas processadas, bolos, fritos, troquem os cereais, massas e pães por vegetais, 
  • Descansem o suficiente para assegurar um equilíbrio metabólico que permitirá ao corpo fazer o seu trabalho,  
  • Tenham uma vida mais activa, prefiram as escadas ao elevador, andar a pé em vez do carro (estacionar mais longe ou sair na paragem anterior), falar ao telefone andando em vez de sentado, façam caminhadas com os amig@s ou desportos colectivos com mais regularidade,  
  • Façam treinos mais intensos (ginásio ou HIIT) não focados na zona abdominal para não estimular um aumento da massa muscular nessa zona.
Querem aparentar ter uma cintura mais fina mas não querem ficar com um six pack ou um abdominal definido e masculino? (pergunta direccionada para as mulheres)
  • Além das sugestões anteriores considerem aumentar o volume das ancas e dos ombros, mantendo o da cintura (ou diminuindo se possível) de forma a aparentarem ter uma cintura mais fina, 
  • Isto pode incluir treinar a massa muscular das pernas de forma isolada, mas também de costas e ombros,  
  • Excluam dos treinos intensos os Agachamentos tradicionais (barra atrás da nuca e rabo empinado) e os Leg Press, pois estes exercícios acabam sempre por trabalhar a zona abdominal (core training) e alargam-na deitando abaixo todo o trabalho de percecionamento da ''perda'' de barriga (criar uma ilusão).