Leite...prós e contras!

O consumo de leite é, hoje em dia, um tema controverso.
Algumas décadas atrás quase ninguém duvidava que o leite era benéfico para a saúde mas essa noção tem vindo a ser contrariada nos últimos 20 anos.
Do ponto de vista da longevidade humana (70 anos no primeiro mundo), o consumo de leite nas nossas sociedades é um costume muito antigo, porém, do ponto de vista da evolução da espécie humana (200.000 anos), é algo bem recente (7.500 anos).
Isto significa que apesar de ser um costume, não quer dizer necessariamente que seja um hábito saudável.
Indica que o Homem conseguiu ter uma vantagem competitiva (pecuária e domesticação de animais), que lhe permitiu pôr outra espécie a produzir (de forma continua) um alimento que era destinado às suas crias (leite), para ele mesmo consumir.

Mas será que este alimento destinado a bebés de outras espécies (vacas, ovelhas, cabras, búfalos) é indicado para o consumo humano?
A dificuldade de escrever sobre este assunto deriva de toda uma poderosa indústria que promove a venda do leite como um bem essencial e necessário que nos atira areia para os olhos. Por outro lado pessoas que criticam o consumo de leite fazem-no por motivos éticos, a sua opinião é baseada em argumentos emocionais/morais/passionais.
Os estudos científicos não são conclusivos e a sua informação contraditória, onde cada lado escolhe as conclusões que melhor servem a sua posição.
Fica difícil encontrar informação transparente e imparcial.

  • O facto de haver pessoas saudáveis que não consomem leite não significa que o leite não possa ser uma mais valia para a nossa saúde, significa apenas que ele não é indispensável, 
  • O facto de a maior parte das pessoas (que bebem leite) não terem uma alimentação no seu geral saudável, também não nos deixa tirar conclusões acerca do valor deste alimento quando observado nos hábitos alimentares deste mesmo grupo de pessoas,
Experiências que pretendem relacionar o consumo de leite com variáveis como a incidência de cancro, obesidade, descalcificação dos ossos, etc, não podem ser conclusivas se os sujeitos das experiências tiverem uma má alimentação, tipicamente ‘’ocidental’’e baseada em comida processada/fast-food!
Temos de fazer uma análise livre de preconceitos e estereótipos.
Para isso temos que ter em conta que o leite que os nossos bisavós bebiam não é o leite que nós hoje bebemos.
O leite produzido hoje em dia pasteurizado a elevadas temperaturas (UHT), é feito para durar meses nas prateleiras dos supermercado e neste sentido não é diferente dos outros alimentos processados, não só é menos rico em termos nutritivos como nocivo para a saúde.
A pasteurização consiste no aquecimento do alimento a uma determinada temperatura (por determinado tempo) e consequente redução a uma temperatura inferior à anterior de forma a eliminar os micro-organismos ali presentes.
Com a desculpa de nos proteger contra os agentes patogénicos mortais contidos no seu estado cru, o leite sofre estes processos que alteram as suas propriedades, nomeadamente:

  • Transformam a estrutura física das proteínas do leite e alteram a forma da configuração dos aminoácidos num conjunto de proteínas não-funcionais altamente alergénicas, 
  • Destroem as bactérias úteis, ​​encontradas naturalmente no leite e reduzem drasticamente o conteúdo de micronutrientes e vitaminas,  
  • Incentivam o crescimento de bactérias nocivas e transformam o açúcar (lactose) natural do leite em beta-lactose. Beta-lactose é rapidamente absorvido pelo corpo humano, causando o retorno da fome logo após o consumo de um copo de leite (especialmente nas crianças),  
  • Tornam insolúvel a maior parte do cálcio encontrado no leite cru, o que pode levar a uma série de problemas de saúde em crianças, entre elas o raquitismo e problemas de dentição,  
  • Destroem cerca de 20% do iodo disponível no leite cru, o qual pode causar prisão de ventre,
  • Entre outros...
A verdade é que tal como os ovos e todos os produtos alimentares, a ética está directamente ligada à saúde e qualidade dos alimentos.
A produção intensiva em sistemas de confinamento com alimentação concentrada, onde as vaquinhas são normalmente criadas com rações ricas em proteína, à base de soja em vez de erva verde e fresca e mantidas em locais apertados (sem pastagem ao ar livre) que são forrados com o próprio esterco durante todo o dia, origina condições para a proliferação de doenças, este é um dos motivos pelo qual o leite tem que ser pasteurizado.
A estas vacas também são dados antibióticos para mantê-las ''saudáveis'' e algumas recebem hormonas de crescimento geneticamente modificadas (rBGH) para aumentar a produção de leite, hormonas e antibióticos que migram para o leite, nestas condições é óbvio que o leite que hoje está disponível nos supermercados não é um alimento saudável nem recomendável.
Por isso este Post vai analisar os benefícios do consumo do leite como este era antes da indústria tomar conta da sua produção, tirado de vaquinhas alimentadas com alimentos que fazem parte da sua alimentação natural, que pastam livremente e que, sendo assim, não precisa de ser pasteurizado nem sofrer alterações químicas e hormonais.
Vamos agora analisar a composição do leite (por cada 100g) e comparar com outros alimentos:


Composição
Calorias
60kcal
35kcal
654kcal
Gordura
- Saturada
- Monoinsaturada
- Polinsaturada
- Ómega 3
- Ómega 6
3,25g
1.865g
0.812g
0.195g
75mg
120mg
0,4g
0,1g
0g
0,2g
119mg
51mg
65,2g
6,1g
8,9g
47,2g
9079mg
38092mg
Carboidratos
- Açúcares
4,52g
4,52g
7,2g
1,4g
13,7g
2,6g
Proteína
3,22g
2,4g
15,2g
Colesterol
10mg
0mg
0mg
Vitaminas:



A
1120UI
1548UI
20UI
B1
B2
B3
B5
B6
B9
B12
0,044mg
0,183mg
0,107mg
0,362mg
0,036mg
5mcg
0,44mcg
0,1mg
0,1mg
0,6mg
0,6mg
0,2mg
108mcg
0mcg
0,3mg
0,2mg
1,1mg
0,6mg
0,5mg
98mcg
0mcg
C
0mg
64,9mg
1,3mg
D
40UI
0UI
0UI
E
0,06mg
1,5mg
0,7mg
K
0,2UI
141mcg
2,7mcg
Minerais:



Cálcio
113mg
40mg
98mg
Cobre
0,011mg
0,1mg
1,6mg
Ferro
0,03mg
0,7mg
2,9mg
Magnésio
10mg
21mg
158mg
Manganésio
0,003mg
0,2mg
3,4mg
Potássio
143mg
293mg
441mg
Selénio
3,7mcg
1,6mcg
4,9mcg
Fósforo
91mg
67mg
346mg
Sódio
40mg
41mg
2mg
Zinco
0,4mg
0,5mg
3,1mg
 
A primeira coisa que nos salta a vista é que afinal o leite não é aquele super alimento rico em nutrientes que as empresas de lacticínios querem nos vender.
De facto comparando com as nozes ou os brócolos (para a mesma quantidade), o leite fica atrás em quase todos os nutrientes com excepção das vitaminas B12, D e o Cálcio.
Vamos então analisar alguns argumentos pró e contra o consumo do leite...
Importante fonte de cálcio
O cálcio é um dos principais componentes dos ossos e a osteoporose é uma doença em que a degradação estrutural e a diminuição da densidade mineral dos ossos aumentam o seu risco de fracturar.
É a causa mais comum de fracturas nos idosos.
Pela lógica, quanto mais alimentos com cálcio comermos, maior prevenção neste processo de desmineralização.
O conteúdo de cálcio é portanto o argumento mais forte dos ''defensores do leite'' que advogam o seu consumo desde a infância até à terceira idade para criar ‘’ossos fortes’’ e combater a osteoporose.
Os ''não defensores do leite'' argumentam que os países sem tradição de consumo de leite e derivados (povos asiáticos por exemplo) têm menor índice de fracturas ósseas do que países ocidentais. Afirmam que o consumo excessivo de leite (o excesso é relativo e não está definido), apesar de fornecer bastante cálcio, fornece também proteína que é digerida num ambiente ácido. 
Para neutralizar esta acidez o corpo liberta cálcio. As reservas de cálcio estão nos ossos, portanto o consumo elevado de leite pode levar à perda de cálcio através desta compensação.
No entanto as coisas não são assim tão simples.

  • Povos asiáticos têm uma alimentação tradicionalmente forte em vegetais e fraca em leite, carne, peixe e derivados, logo não consomem proteína nas mesmas quantidades que uma pessoa com uma dieta ''ocidental'',
  • No ocidente comemos muita carne, bebemos muito leite e derivados, muita comida processada e faz sentido que assim o nosso nível de acidez seja elevado ao ponto de prejudicar as nossas reservas de cálcio,
  • Isso não significa que beber leite aumente o risco de fracturas ou que nos retire cálcio dos ossos, até porque o leite por si só não é assim tão rico em proteína (3g por cada 100g) pois mais de 80% do seu conteúdo é água.
A minha conclusão em relação a esta questão do cálcio é que os dois lados não apresentam argumentos sólidos para o consumo ou a abstenção:
  • O leite é uma boa fonte de cálcio, mas a noz não lhe fica atrás e comparando os dois alimentos, até ficamos melhor nutridos consumindo frutos secos do que bebendo leite, 
  • Por outro lado se a proteína do leite fosse um problema na desmineralização dos nossos ossos, então a noz que tem muito mais proteína que o leite seria muito mais problemática.
Importante fonte de vitamina B12 e vitamina D
Estes sim são dois pontos fortes do leite que poucas pessoas realçam mas que são bastante importantes, visto não serem encontrados nos alimentos vegetais.
A vitamina D ajuda no transporte do cálcio e este é um ponto a somar ao argumento anterior. 
As nozes contêm muito cálcio mas não esta vitamina e neste sentido o leite torna-se uma muito melhor fonte de cálcio devido a esta poderosa adição,
O corpo humano consegue sintetizar Vitamina D através da exposição solar, o que faz com que o leite não seja, no que diz respeito ao cálcio e ao seu transporte (vitamina D), um bem essencial, mas sim uma boa fonte.
A vitamina B12 desempenha funções importante no metabolismo dos aminoácidos e dos ácidos nucleicos, é indispensável na formação do sangue, na prevenção de problemas cardíacos e derrames cerebrais e na manutenção do sistema nervoso.
Esta só é encontrada em alimentos de origem animal (com excepção de algumas algas marinhas), e neste sentido o leite pode ser uma boa opção e importante fonte deste nutriente.
Intolerância à Lactose
Os ''não defensores do leite'' têm como argumento a intolerância à lactose. 

Afirmam que não é ''natural'' beber (durante toda a vida) algo que é destinado a bebés, ainda por cima de outra espécie e que por este motivo grande parte da população é intolerante à lactose e não consegue beber leite.
Vamos observar em que consiste esta condição:

  • Intolerância à lactose consiste na falta de enzimas (lactases) que digerem este carboidrato presente no leite (a lactose). Entre povos asiáticos e africanos esta condição é mais predominante, devido provavelmente à menor tradição de consumo de leite e seus derivados. Quando nascemos e até aos 6 meses somos quase que exclusivamente alimentados com leite materno, mas à medida que substituímos o leite por outros alimentos, perdemos parcialmente (uns mais que outros) essa capacidade de absorver a lactose,
  • Muitas pessoas que sofrem desta condição conseguem absorver leite em pequenas quantidades e espalhadas ao longo do dia,
  • Têm também mais facilidade em comer os seus derivados (queijo e iogurte), que devido ao processo de fermentação ganham algumas dessas enzimas (lactase) e perdem um pouco do seu conteúdo de lactose.
Esta questão da intolerância à lactose é particular e não torna o leite, por si só, um bom ou mau alimento, simplesmente não é recomendável (em grandes quantidades) a pessoas que sofrem desta condição, salvaguardando os derivados.
Correlação com doenças cardíacas:
Os ''não defensores do leite'' argumentam que a gordura saturada do leite assim como o seu conteúdo de colesterol pode provocar aterosclerose, doença inflamatória crónica caracterizada pela formação de ateromas dentro dos vasos sanguíneos.
Os ateromas são placas, compostas especialmente por lípidos e tecido fibroso, que se formam na parede dos vasos. O volume dos ateromas aumenta progressivamente, obstruindo os vasos sanguíneos e originando o seu entupimento e posterior rompimento.
Já desmistificamos este ponto nos Posts:

E ficou provado que não há correlação entre gordura saturada, colesterol e doenças cardiovasculares.
Correlação com cancro e processos inflamatórios:
A produção intensiva cria animais doentes que necessitam de tomar antibióticos para manter o seu nível de produção.
É também administrada um hormona de crescimento bovina sintetizada (rBGH) que é utilizada para aumentar a produção de leite.
Todos estes compostos passam da vaca para o leite que ela produz e esta hormona aumenta os níveis de factor de crescimento da insulina 1 (IGF-1) de quem o bebe.
Este factor de crescimento está correlacionado com doenças cancerígenas e processos inflamatórios que agravam estas e outras doenças.
Vamos lá ver isto com olhos de quem quer perceber:

  • Se estamos a explorar animais de uma forma intensiva, ''desumana'' e cruel, para aumento das margens de lucro, então o resultado é criarmos animais doentes que vão passar toda essa crueldade para a sua carne e o seu leite, 
  • Se lhes damos químicos para artificialmente aumentar a sua produção e para curar os sintomas das doenças que advêm deste tratamento ‘’desumano’’, então esses mesmo químicos serão metabolizados e passados nos seus produtos.
Coisa boa não vai sair daqui, isso é óbvio! 
Não existem provas concretas que ligam o consumo de leite às doenças cancerígenas e não é por beber hoje um copo de leite que amanhã eu morro de cancro, mas todo este sistema de produção altera a qualidade dos nossos alimentos e terá consequências nefastas na nossa saúde, isso é certo!
Uma dessas consequências são as doenças cancerígenas, não tenho dúvidas nenhumas.
A solução aqui é consumir leite produzido de uma forma ética, por vacas que pastam em liberdade e comem alimentos pertencentes à sua dieta milenar, sem adição de químicos nem antibióticos nem hormonas. 
Não há outra maneira.
Conclusão:
As vantagens do consumo do leite só podem ser observadas numa alimentação saudável, só assim estaremos a ser honestos com a nossa análise. 
O leite adicionado a uma má dieta não irá contribuir para uma saúde melhor, mas o mesmo é válido para todos os alimentos.
O leite não é um alimento essencial, muitas pessoas não bebem leite e não têm problemas de ossos nem sofrem de doenças que o leite supostamente ajuda a prevenir. 
Tudo o que está no leite pode ser encontrado noutros alimentos, em maior ou menor quantidade.
O leite tem nutrientes como a Vitamina B12, D e o Cálcio em quantidades generosas e isso torna-o uma mais valia.
Numa alimentação saudável, o leite pode suprir algumas das nossas necessidades de uma forma prática e simples, pois não precisa de ser cozinhado nem preparado para ser consumido.
O leite é um alimento desenhado pela natureza para crescer, toda a sua concentração e especial combinação de aminoácidos, ácidos gordos e carboidratos provocam o anabolismo e estimulam a produção de insulina, por isso é melhor destinado a quem tem um grande gasto de energia (atletas) ou a quem procura ganhar peso/volume/massa muscular.
No entanto esta mais valia é observada no leite não pasteurizado de produção não intensiva, pois os rácios de Ómega-3 e Ómega-6, as enzimas, bactérias benéficas e nutrientes estão todos presentes e não foram alterados ou anulados pelos processos de pasteurização e homogeneização.
Infelizmente termos como ''orgânico'' ou ''biológico'' não são garantia de um tratamento ético dos animais, ainda há muito trabalho por fazer na credibilização deste produto.
Os derivados do leite (queijos e iogurtes) são os mais adequados a quem procura os benefícios deste alimento através de um consumo moderado e saudável, visto ser difícil confiar em palavras como biológico e orgânico. Estes derivados são também mais aconselhados a quem é intolerante à lactose.
Pessoas que querem definir, perder volume, perder peso ou gordura não devem beber leite, seja ele sem lactose ou magro, nem os seus derivados.